A história está repleta de homens que alegaram ter vindo de Deus, ou que eram deuses ou que portavam mensagens divinas — Buda, Maomé, Confúcio, Cristo, Lao-Tsé e milhares de outros até a pessoa que, hoje mesmo, fundou uma nova religião. Cada um deles tem o direito de ser ouvido e levado em consideração. No entanto, como é necessário um parâmetro externo e fora daquilo que está sendo mensurado, alguns testes permanentes devem estar disponíveis para todos os homens, de todas as civilizações e em todas as épocas, pelos quais se possa decidir se algum desses requerentes, ou todos eles, tem fundamento no que alegam. Esses testes são de dois tipos: razão e história. Razão porque todos a têm, mesmo os que não têm fé; história, porque todos nela vivem e devem saber algo a seu respeito.
A razão prescreve que, se algum desses homens verdadeiramente veio de Deus, o mínimo que Deus poderia fazer para amparar essa alegação seria preanunciar sua vinda. Os fabricantes de automóvel anunciam aos consumidores quando chegará um novo modelo. Se Deus enviou alguém de sua parte, ou se Ele Próprio veio com uma mensagem de importância vital para todos os homens, pareceria razoável que, primeiro, Ele deixasse os homens saber quando o seu mensageiro viria, onde nasceria e onde viveria, que doutrina ensinaria, que inimigos faria, que programa adotaria para o futuro e de que maneira morreria. À medida que o mensageiro se conformasse a esses anúncios, poderíamos julgar a validade de sua alegação.
A razão também nos assegura que, se Deus não fez isso, então, nada impediria que qualquer impostor aparecesse na história e dissesse: “Venho de Deus” ou “Um anjo apareceu para mim no deserto e deixou-me esta mensagem”. Em casos como esse, não existiria um modo objetivo, histórico, de testar o mensageiro. Para isso, haveria apenas a sua palavra e, é claro, ele poderia estar errado.
Se um visitante de um país estrangeiro chegasse a Washington e dissesse ser diplomata, o governo pedir-lhe-ia o passaporte e outros documentos que atestassem que ele representava determinado governo. Os documentos precisariam ter data anterior à sua chegada. Se tais provas de identificação são pedidas a representantes de outros países, a razão certamente deverá exigi-las de mensageiros que alegam ter vindo de Deus. Para cada motivo do requerente, a razão pergunta: “Que registro havia antes de seu nascimento de que você viria?”.
Com esse teste podemos avaliar os requerentes. (E, nesse estágio preliminar, Cristo não é maior que os outros.) Sócrates não teve ninguém para predizer-lhe o nascimento. Ninguém preanunciou Buda e sua mensagem ou disse o dia em que se sentaria debaixo da árvore. Confúcio não teve registrado o nome da mãe e o local de nascimento, nem isso fora dado aos homens séculos antes que ele aparecesse, de modo que, quando surgisse, os homens soubessem que era um mensageiro de Deus. Entretanto, com Cristo foi diferente. Por conta das profecias do Antigo Testamento, Sua vinda era esperada. Não existiam profecias a respeito de Buda, Confúcio, Lao-Tsé, Maomé ou qualquer outro; mas existiam profecias a respeito de Cristo. Os outros simplesmente vieram e disseram: “Eis-me aqui, acreditem em mim”. Eram, portanto, apenas homens entre homens, e não o divino no humano. Só Cristo cruzou essa linha, ao dizer: “Buscai os escritos do povo judeu e a história narrada pelos babilônios, persas, gregos e romanos”. (Por ora, os escritos pagãos e até o Antigo Testamento podem ser considerados apenas como documentos históricos, não como obras inspiradas.)
É verdade que as profecias do Antigo Testamento podem ser mais bem compreendidas à luz de seu cumprimento. A linguagem da profecia não tem a exatidão da matemática. Ainda assim, se examinarmos cuidadosamente as várias correntes messiânicas no Antigo Testamento e compararmos o quadro resultante com a vida e a obra de Cristo, podemos duvidar de que as antigas profecias apontam para Jesus e para o Reino que ele instituiu? A promessa de Deus aos patriarcas de que por intermédio deles as nações da terra seriam abençoadas; a profecia de que a tribo de Judá seria a maior entre as outras tribos hebraicas até a vinda daquele a quem todas as nações obedeceriam; o fato estranho, mas inegável, de que na Bíblia dos judeus de Alexandria, a Septuaginta, encontramos profetizado de maneira clara o nascimento virginal do Messias; a profecia de Isaías 53 a respeito do sofredor paciente, o Servo do Senhor, que entregaria sua vida como oferta expiatória pelas ofensas do povo; as perspectivas do Reino glorioso, eterno, da casa de Davi — em quem, senão em Cristo, essas profecias são cumpridas? Do ponto de vista estritamente histórico, há uma singularidade que põe o Cristo à parte dos fundadores de todas as outras religiões. E, uma vez que o cumprimento dessas profecias ocorreu historicamente na pessoa do Cristo, não só cessaram todas as profecias em Israel, mas houve a suspensão dos sacrifícios quando o verdadeiro Cordeiro Pascal foi imolado.
Voltemos ao testemunho pagão. Tácito, ao falar para os antigos romanos, disse: “As pessoas, em geral, são convencidas pela fé nas antigas profecias de que o Oriente deve triunfar e que da Judeia há de vir o Mestre e o Senhor do mundo”. Suetônio, no relato sobre a vida de Vespasiano, descreve, da seguinte maneira, a tradição romana: “Era crença antiga e invariável em todo o Oriente que, por profecias indubitavelmente acertadas, os judeus fossem alcançar o poder supremo”.
A China tinha a mesma expectativa, mas, por estar do outro lado do mundo, acreditava que o grande Homem Sábio nasceria no Ocidente. Os Anais do Império Celestial apresentam a seguinte afirmação: No vigésimo quarto ano de Zhou-Wang, da dinastia de Zhou, no oitavo dia da quarta lua, apareceu no Sudoeste uma luz que iluminou o palácio do rei. O monarca, atingido por seu esplendor, interrogou os sábios. Apresentaram-lhe livros em que esse prodígio significava o aparecimento de um grande Santo do Ocidente, cuja religião seria introduzida em seu país.
Os gregos O esperavam, pois Ésquilo, em seu Prometeu, seis séculos antes da Sua vinda, escreveu: “Não tentes de modo algum dissuadir-te desta maldição até que Deus surja, para aceitar sobre a própria cabeça o suplício de teus pecados”. Como os magos do Oriente sabiam a respeito de sua vinda? Provavelmente, por conta das muitas profecias que circulavam pelo mundo dos judeus, bem como pela profecia feita para os gentios por Daniel, séculos antes de Seu nascimento. Cícero, depois de relatar os dizeres dos oráculos antigos e das sibilas sobre um “rei a quem devemos reconhecer para sermos salvos”, perguntou, com esperança: “A que homem e a qual período temporal essas profecias se referem?”. A quarta écloga de Virgílio relatou a mesma tradição ancestral e falava de uma mulher casta, sorrindo para seu menino infante, que poria fim à era do ferro. Suetônio citou um autor contemporâneo a fim de demonstrar que os romanos tinham grande temor do rei que governaria o mundo, de modo que ordenaram que todas as crianças nascidas naquele ano fossem mortas — uma ordem que não foi cumprida, exceto por Herodes. Não só os judeus esperavam o nascimento de um Grande Rei, um Homem Sábio e um Salvador, mas Platão e Sócrates também falavam de um Logos e de um Sábio Universal “ainda por vir”. Confúcio mencionava “o Santo”; as sibilas, “um Rei Universal”; o dramaturgo grego, um salvador e redentor para libertar o homem da “maldição primordial”. Todos esses estavam no lado gentílico da expectativa. O que põe o Cristo à parte de todos os homens é que, em primeiro lugar, Ele era esperado; mesmo os gentios ansiavam por um libertador ou um redentor. Só este fato O distingue de todos os outros líderes religiosos.
Uma segunda distinção é que, uma vez surgido, Ele afetou a história com tamanho impacto que a dividiu em dois períodos: um antes e outro depois de Sua vinda. Buda não fez isso, nem tampouco nenhum outro grande filósofo indiano. Mesmo aqueles que negam Deus devem datar seus ataques a Ele com A. D. ou algo assim muitos anos após sua vinda. Um terceiro fato que O aparta de todos os outros é este: qualquer outra pessoa que já veio a este mundo veio para viver. Ele veio para morrer. A morte foi a pedra de tropeço de Sócrates — interrompeu seu magistério. Entretanto, para Cristo, a morte era a meta e o cumprimento de sua vida, o ouro que buscava. Poucas de suas palavras ou ações são inteligíveis sem referência à cruz. Apresentou-Se como salvador e não simplesmente como Mestre. Não significava nada ensinar os homens a serem bons, a menos que também lhes desse o poder de serem bons, após resgatá-los da desilusão da culpa.
A história de toda vida humana começa com o nascimento e termina com a morte. Na Pessoa de Cristo, contudo, a morte veio primeiro e a vida, por último. A Escritura descreve-o como “o cordeiro imolado desde a fundação do mundo” (Apocalipse 13,8). Foi imolado intencionalmente pelo primeiro pecado e revolta contra Deus. Não tanto que Seu nascimento tenha lançado sombra em Sua vida e, deste modo, o levado à morte; ao contrário, em primeiro lugar estava a cruz e, esta, de trás, lançou sombra até o nascimento. Foi a única vida no mundo vivida de trás para a frente. Como a flor na parede fendida fala do poeta da natureza, e como o átomo é a miniatura do sistema solar, da mesma maneira, Seu nascimento fala do mistério do patíbulo. Foi do sabido ao conhecido, da razão de sua vinda manifestada no nome de “Jesus” ou “Salvador” até o cumprimento de sua vinda, a saber, até a morte na cruz.
João nos dá Sua pré-história eterna; Mateus, Sua pré-história temporal por intermédio da genealogia. É muito significativo que tantos de Seus ancestrais temporais estivessem relacionados a pecadores e estrangeiros! Essas máculas no brasão de sua linhagem humana sugerem o compadecimento da Aliança para com os pecadores e para aqueles alheios a ela. Ambos esses aspectos de Sua compaixão seriam, posteriormente, lançados contra Ele como acusações: “amigo de pecadores”, “é um samaritano”. A sombra de um passado maculado, todavia, prediz o futuro amor pelos que trazem a mácula. Nascido de uma mulher, era um homem e podia ser um com toda a humanidade; nascido de uma virgem, que foi coberta pelo Espírito Santo e “cheia de graça”, também estava fora daquela corrente de pecado que infectou todos os homens.
Fonte: Sheen, Fulton J. Box - Vida de Cristo . Petra. Edição do Kindle.
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